quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

UM SIMPLES SABONETE...


Acho que em todos os textos falo sobre as minhas memórias, mas não consigo me imaginar vivendo sem lembrar de que tive uma vida muito linda e feliz (e ela está cada vez melhor), por isso mais uma vez venho aqui falar das cenas que preenchem minhas noites de insônia.
Durante uma volta em um ônibus pelas "calles" de Buenos Aires, entre as lembranças de uma infância não muito distante, me deparei com uma personagem que marcou a minha vida, e tenho certeza de que marcou a vida de muitas pessoas no bairro em que cresci em São Paulo, a Bela Vista, popularmente chamado de Bexiga.
Era conhecido com Toninho Babão, por causa de uma deficiência que eu desconheço. Vivia na R. Manoel Dutra, sempre sentado na porta do joalheiro Mirimi. Todos mexiam com ele, pois era um palmeirense fanático, que ficava muito bravo quando a molecada do bairro gritava "RIPA NO PALESTRA", acho que nada tirava mais o Toninho do sério do que aquilo.
Eu via tudo de um ângulo mais simples, da visão de uma menina de uns 5 ou 6 anos de idade, onde os pequenos gestos são marcantes. Nunca aborreci o Toninho, o amava como um amigo, pois ele me tratava assim.
Aquele homem com pensamentos de criança marcou minha infância de uma forma única. Durante anos ele se sentava a porta da minha casa, na Rua Dr. Luís Barreto, no dia do meu aniversário com um pequeno embrulho em suas mãos, uns dos presentes mais singelos e adoráveis que já recebi, um sabonete.
Hoje vejo algo muito maior naquilo, vejo um sentimento impossível de descrever, pois o valor não estava na matéria, mas no olhar e nas tentativas do Toninho de falar para todo mundo que me conhecia desde pequena. Com seus gestos com as mãos e sua fala comprometida, ele demostrava um afeto por mim que acho que nunca mais encontrei em ninguém.
Me lembro do dia em que recebi a notícia de seu falecimento, era um domingo de calor em Santos, naquele instante senti uma parte, maravilhosa, da minha infância indo embora junto com ele, chorei como se tivesse perdido um parente próximo.
Naquele dia perdi um grande amigo com quem nunca troquei uma palavra, mas que sempre falou com seus lindos olhos azuis o quanto eu era importante para o seu mundo, e isso já me bastava.

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